O general Fernando Azevedo e Silva foi uma das principais peças militares do governo Bolsonaro. Empossado como ministro da Defesa bem no começo de janeiro de 2019, ele seria mais tarde um dos personagens centrais naqueles dias tensos em que Jair Bolsonaro tentou de fato dar um golpe militar.
Bolsonaro chamou o golpe de âEstado de emergĂȘncia do bemâ â ele queria usar as Forças Armadas para abrir o comĂ©rcio durante a pandemia, enfrentando governadores e prefeitos. Com tanques e militares nas ruas, claro. Uma loucura.
A conversa jĂĄ rodava pelos bastidores do poder, mas agora o jornalista Guilherme Amado traz em seu novo livro (Sem mĂĄscara: O governo Bolsonaro e a aposta pelo caos, editora Companhia das Letras) um diĂĄlogo entre Bolsonaro e Dias Toffoli. Vale lembrar que o general Azevedo e Silva tinha sido assessor de Toffoli no STF antes de entrar para o governo. Trecho do livro:
Foi recebido na biblioteca. Era a primeira oportunidade que Toff oli tinha desde aquele 29 de março, para, a sós com Bolsonaro, perguntar ao presidente por que demitira o ministro. Alguns momentos da conversa foram interrompidos por um garçom e um ajudante de ordens. O general não contara a Toffoli o motivo da demissão, fiel a uma postura discreta que, ao sair da assessoria do ministro do Supremo para o Ministério da Defesa, avisou que teria em relação aos temas de governo.
Amado entĂŁo publica esse diĂĄlogo entre Bolsonaro e Toffoli:
âPor que o senhor demitiu o general Fernando?â
âQueria fazer um estado de emergĂȘncia do bem e ele nĂŁo quis .â
âComo assim, presidente? O que seria isso?â, perguntou um espantado Toffoli.
âQueria colocar o ExĂ©rcito nas ruas para abrir as lojas e abrir os estados e municĂpios porque os governadores e prefeitos fecharam tudo. EntĂŁo eu queria abrir, tentar manter o emprego e a economia funcionandoâ, detalhou Bolsonaro, como se descrevesse algo trivial.
O presidente explicou a Toffoli que o Brasil nĂŁo aguentaria mais um ano com âtudo fechadoâ. Disse saber que, âcom a pandemia e a economia fechandoâ, seu governo seria impactado. Teria um preço a pagar pela economia estagnada, sem crescimento.
âPresidente, isso nĂŁo tem cabimento. Para de exagerar, para com essa coisaâ, aconselhou Toffoli, reeditando a postura que em diferentes ocasiĂ”es havia adotado na presidĂȘncia do STF. Bolsonaro ouviu, nĂŁo contra-argumentou, e a conversa naturalmente mudou para outro assunto.
Jair enfiaria o paĂs em uma aventura. O ExĂ©rcito estĂĄ metido atĂ© o pescoço no governo Bolsonaro. O governo Bolsonaro Ă© de fato um governo militar. Ă certo que muitos generais o apoiariam. Digo isso para nĂŁo cairmos na farsa de que Jair Ă© um golpista solitĂĄrio, pois nĂŁo Ă©. Mas, ao menos nesse episĂłdio, o bom senso de um general apareceu.
âEstado de emergĂȘncia do bem.â