💧 Resumão do Demori #22: POA é "case" global
A cidade do estado mínimo: Bem-vindo$ a Porto Alegre.
E finalmente o neoliberalismo tem sua cidade modelo. Porto Alegre vive a sorte do “estado mínimo”, da máquina pública “enxuta” e da “eficiência”. Não resta dúvida: a cidade virou um case global das políticas que pregam que o estado precisa ser minúsculo, que o estado só atrapalha, que a salvação está na iniciativa privada, que é preciso extinguir órgãos públicos e demitir servidores. Não é preciso olhar para a Argentina de Milei quando temos um exemplo no nosso próprio (e alagado) quintal. Abaixo, elenco os argumentos. Mas antes, vamos rapidamente para o…
…festival de incompetência
A chuva voltou a cair com força no Rio Grande do Sul na última semana. De acordo com a Defesa Civil, até a noite de sexta-feira (24), eram mais de 581 mil pessoas desalojadas, sendo 63 mil em abrigos, 163 mortes e 63 desaparecidos. Mais de meio milhão de refugiados climáticos, muitos em condições sub-humanas.
Um exemplo: assim ficou o bairro Marmitt na cidade de Estrela.
E aqui estão parte do moradores do bairro, acampados sob um frio de 5 graus em uma área ocupada. Até agora, só quem apareceu foi a polícia (para forçar a desocupação). Apenas voluntários cuidam dessas pessoas.
🏘️ O Rio Grande do Sul vai enfrentar um problema crônico de moradia.
Pânico na capital
Em Porto Alegre, moradores dos bairros Menino Deus e Cidade Baixa estavam retornando para suas casas quando foram surpreendidos por um novo alagamento. Em nenhum momento esses moradores foram alertados que a água invadiria os bairros novamente. Assim como no início do mês, quando essas regiões ficaram embaixo d’água, a Defesa Civil de Porto Alegre demorou para emitir o alerta de inundação. O prefeito Sebastião Melo, ao que tudo indica, apenas torce para a chuva parar.
Alertas ignorados
No começo da semana o Inmet havia emitido um alerta laranja, que significa perigo, e nem assim a população destes bairros foi informada. O Metsul avisou na terça: possibilidade de chuva forte em regiões alagadas. Nada foi feito. A capital e municípios próximos receberam uma média de 100mm de chuva entre a quarta-feira e a quinta-feira e as pessoas só souberam que tinham que sair de casa quando a água batia nas canelas.
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A CIDADE “CASE” DO ESTADO MÍNIMO
Em sua coletiva na tarde de quinta, quando a cidade naufragava mais uma vez e crianças de colo eram tiradas de uma creche na zona sul – com os pais se arriscando com água até o peito –, o prefeito Sebastião Melo confessou de modo meio envergonhado que foi um ERRO extinguir o Departamento de Esgotos Pluviais (DEP) de Porto Alegre.
🛟 Porto Alegre é o exemplo máximo de cidade tentando, há anos, ser ESTADO MÍNIMO. Quer um “case” de uma administração pública com estado mínimo? Olhe para Porto Alegre.
Quem acabou com o DEP foi Nelson Marchezan, o antecessor. Melo está, portanto, confessando um pecado alheio. O ex-prefeito Marchezan matou o órgão que deveria zelar pela cidade evitando alagamentos e jogou o trabalho no colo de outras autarquias, sobretudo o DMAE, que inicialmente cuidava de esgotos, e não das águas da chuva.
Seria o equivalente a Veneza excluir o órgão público que cuida do sistema anti-enchentes da cidade, chamado MOSE. Para lembrar: Porto Alegre está quase no nível do mar e tem dezenas de quilômetros de diques, muros e várias bombas hidráulicas justamente pelo risco de inundação.
Dá pra imaginar que alguém exclua justamente ESTE departamento da cidade? Veja abaixo o sistema anti-enchente de Veneza. Você imagina algum imbecil matando o órgão que cuida dessa estrutura?
A extinção do DEP acumulou trabalho nas costas de funcionários públicos do DMAE fazendo as promessas de sempre: mais “eficiência” e menos “gastos”.
O DMAE, claro, sofre para dar conta de tudo. Um documento assinado por 33 engenheiros e técnicos do Rio Grande do Sul afirma que sistema de defesa contra enchentes de Porto Alegre é “robusto, eficiente, e fácil e operar e manter”, mas houve falhas de manutenção porque, entre outras coisas, faltam 2.400 funcionários no DMAE.
Funciona assim na cidade “case” do estado mínimo: conforme estrangula o serviço público, “prova” que ele é ineficiente. Receita velha e conhecida.
Vejam a fala de Marchezan ao matar o DEP: aplicar o dinheiro na “vida real” das pessoas. Que vida “real”, senhor Marchezan? Acabou a vida de muita gente. Acabaram-se os negócios. A capital está no chão. Será que o senhor e o MBL – que o apoiou com métodos sórdidos – pedirão desculpas?
Com Melo o projeto segue. Irão eliminar mais de 3 mil postos de trabalho da limpeza urbana da cidade. Quem estava e estará limpando a cidade depois de passado o caos? Justamente essas pessoas. Alguma alma se convence de que há TRÊS fucking MIL CARGOS SOBRANDO no departamento de limpeza urbana?
Ponte provisória não resiste à força da água
No Vale do Taquari, duas pontes provisórias construídas pelo Exército sobre o Rio Forqueta foram embora com a água. Elas são chamadas de “passadeiras” e servem apenas para pedestres. Faziam a ligação entre os municípios de Lajeado e Arroio do Meio.
Mourão rima com o que?
Depois de 3 semanas de desastre, acharam o Mourão, o senador do Rio Grande do Sul. Mas talvez teria sido melhor pra ele não ter sido achado.
Leite no Roda Viva
O governador Eduardo Leite, aquele que disse não ser o momento para apontar culpados, foi o entrevistado da semana do programa Roda Viva, da TV Cultura. E como não tinha show da Ivete Sangalo programado, Leite permaneceu em Porto Alegre e a produção do programa foi até a capital gaúcha. Não vimos um festival de panos passados para o governador, ao contrário, alguns dos entrevistadores convidados foram até duros com o tucano, que, durante boa parte do programa, apenas se defendeu.
Com muita desinformação e as mesmas desculpas de sempre, Leite afirmou que a responsabilidade pelos mecanismos de prevenção de desastres seria exclusividade dos municípios, o que não é verdade. Só para citar um exemplo, segundo a lei 12.608/2012, que institui a Política Nacional de Proteção e Defesa Civil, cabe aos municípios, o Estado e o governo federal a execução do Plano Nacional de Proteção e Defesa Civil. Ou seja, tentou empurrar aos municípios uma responsabilidade que também caberia ao governo do Estado. E vamos ficar por aqui porque a lista vai longe: "A gente reconhece a ciência e busca dar toda condição para que o governo possa trabalhar melhor sobre esses temas", disse o governador.
Ele também se desculpou por ter se “expressado mal” em relação à declaração dada à Folha de São Paulo em que disse que não deu ouvidos aos alertas sobre possíveis catástrofes ambientais que poderiam ocorrer no Estado, afirmando que o governo tinha “outras agendas”. Tá aí o resultado das outras agendas: mais de 160 mortos e contando.
Fora de operação
A catástrofe das chuvas também acirra o problema das questões estruturais e logísticas no Rio Grande Sul. Segundo a Fraport, empresa que administra o Aeroporto Salgado Filho, não há previsão para que o aeroporto volte a operar. A administrador, inclusive, solicitou à Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) a renegociação de termos do contrato de concessão. A empresa alega que até agora não foi possível mensurar os prejuízos causados pela inundação.
A Fraport, empresa privada alemã, está sendo pouco cobrada para recuperar o aeroporto, um negócio seu. Ninguém obrigou a empresa a assumir o local. Imagino se o aeroporto fosse administrado pelo poder público…
Já na Estação Rodoviária a situação é um pouco menos calamitosa, mas ela também segue sem uma previsão concreta de quando poderá voltar a receber passageiros. O trabalho de limpeza já começou, porém, as chuvas dos últimos dias atrasaram as atividades mais uma vez. Segundo Giovanni Luigi, administrador da Rodoviária, os prejuízos, até o momento são incalculáveis: “Vamos tentar ver o que a gente consegue salvar e fazer um rescaldo. Daqui a alguns dias teremos noção se poderemos retornar ao menos com uma parte da Rodoviária. Antes disso, precisaremos retirar toda água, religar sistemas e isso depende de energia elétrica. Por enquanto nem cogitamos religar a luz por lá”, disse em entrevista ao Correio do Povo.
Uma estação provisória está funcionando na Zona Norte da Capital, com um número limitado de itinerários. Já as rodovias, tanto federais quanto estaduais, até a sexta-feira (24) apresentavam 103 pontos de bloqueio total ou parcial no RS.
Zona Sul embaixo d’água
Na chamada Costa Doce, região que abrange os municípios banhados pela Lagoa dos Patos, a situação continua preocupante. Cidades como Pelotas, Rio Grande e São Lourenço do Sul continuam sendo castigadas por alagamentos. A prefeitura de Pelotas, maior cidade da região, emitiu alertas para diversos bairros na última sexta-feira (24) e os moradores foram orientados a deixarem suas casas. Já a Prefeitura de São Lourenço do Sul não recomenda o retorno dos moradores às suas casas, mesmo que as águas da Lagoa dos Patos tenham apresentado um pequeno recuo na sexta-feira (24). A única boa notícia em relação ao clima no Rio Grande do Sul é a de que, segundo os institutos de meteorologia, o mês de junho deve ser mais seco que o mês de maio.
Zambelli vira ré em caso de invasão ao site do CNJ
Apesar de toda a tragédia que se abate sobre o Rio Grande do Sul, algumas notícias, felizmente, podem nos encher de esperança por um mundo melhor. A deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), virou ré no Supremo Tribunal Federal (STF) acusada de envolvimento na invasão ao site do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em janeiro do ano passado. Além da deputada, o hacker Walter Delgatti Neto também responderá pelo crime. Os dois são acusados de falsidade ideológica e invasão a dispositivo informático.
A Primeira Turma do STF votou por unanimidade em tornar réus os acusados após denúncia oferecida pela Procuradoria-Geral da República (PGR). Segundo a denúncia, a deputada teria sido a autora intelectual (não, não é ironia) do crime, enquanto Delgatti foi o responsável pela invasão ao sistema. A relatoria do caso ficou com o ministro Alexandre de Moraes, grande desafeto de Zambelli. Votaram a favor da abertura da ação penal os ministros Luiz Fux, Carmen Lúcia, Flávio Dino, Cristiano Zanin, além do próprio Moraes.
“Desinteligência”
Definitivamente, a coisa não está fácil para a deputada bolsonarista. Na sessão que analisou a denúncia da PGR, a ministra Cármen Lúcia afirmou, de forma bastante muito polida, que a Zambelli não era lá muito esperta: “Quando Vossa Excelência [Alexandre de Moraes] descreve que havia entre as notas com as providências a possibilidade de Vossa Excelência ter, inclusive, determinado a própria prisão, eu começo a não me preocupar mais só com a inteligência artificial, mas com a desinteligência natural de alguns que atuam criminosamente, além de tudo sem qualquer tracinho de inteligência”
Mesmo que todo mundo já soubesse disso, Moraes ainda respondeu, em tom sério, mas que acabou soando como uma galhofa involuntária: “Eu chamaria burrice mesmo natural, achando que isso não fosse ser descoberto. Uma vez emitido mandado de prisão e colocado dentro do CNJ, imediatamente vai para a Polícia Federal e todos os aeroportos”.
Após a onda de elogios, a defesa da deputada deverá entrar com um pedido de suspeição contra Carmen Lúcia e Moraes, em função das expressões utilizadas pelos ministros. Para quem já foi chamada de burra, biruta e bandida pela ex-deputada Joice Hasselmann, parece que, ao menos, houve alguma evolução. Em caso de condenação, a deputada poderá cumprir uma pena que pode chegar a seis anos em regime semiaberto, além da perda do mandato. E, ao que parece, não vai adiantar recorrer ao tio Elon Musk...
_ pesquisa: Gerson Urguim
Demori, quando você voltar das férias, poderia por favor, investigar a situação das linhas de crédito abertas pelo BNDES para os afetados pela enchente no RS?
Alguns estão dizendo que o governo anunciou as linhas de crédito mas nada efetivamente está sendo feito.
Nao moro no RS, mas acompanho diariamente o que esta ocorrendo nesse estado, após a tragédia. Sobre seus comentários, gostaria que voce complementasse, informando quem era, e o que fizeram com relação proteção da cidade/estado, as administrações 20 anos anteriores ao Sr Leite. É no mínimo injusto cobrar dele, obras que não seriam realizada em curto espaço de tempo, ou seja, dentro da gestão dele. É preciso questionar os governadores, daquelas gestões, por qual motivo nada foi feito neste sentido.